Um Mundo Policêntrico Só Será Possível pela Intervenção da “Sexta Grande Potência”
por Paris Yeros
Universidade Federal do ABC (UFABC), Brasil – Dezembro 2023
O imperialismo coletivo da Tríade (EUA-UE-Japão) evoluiu após a Segunda Guerra Mundial sob a égide dos Estados Unidos para dar coerência estratégica à expansão do capitalismo monopolista contra o Leste socialista e o Sul emergente. Seu objetivo era enfrentar resistências sem precedentes ao capitalismo monopolista, tanto pelo lado do sistema soviético, que havia vencido sobre o nazismo, como no Terceiro Mundo em vias de descolonização. Essa contradição era a essência da rivalidade sistêmica da Guerra Fria. As suas origens se encontram justamente nos dois grandes acontecimentos anti-imperialistas do século XX: a revolução socialista e a descolonização geral.
Diz-se que o pós-guerra configurou um sistema “bipolar” entre Leste e Oeste. De fato o conflito foi muito maior. Consistia numa contradição sistêmica entre o imperialismo e todas as forças anti-imperialistas, não apenas aquelas provenientes do Leste. E mais: nessa contradição, a essência do conflito, mesmo entre Leste e Oeste, logo passou a girar em torno das forças de libertação nacional dos povos do Terceiro Mundo. Isto é, as lutas de libertação nacional se tornaram a principal força motriz da rivalidade sistêmica do pós-guerra. Elas encontravam na União Soviética um contrapeso sistêmico ao imperialismo, senão apoio direto, enquanto o próprio conflito Leste-Oeste ganhava o seu dinamismo nas lutas de libertação nas periferias. Não é por acaso que a maior confrontação nuclear da Guerra Fria se deu em função da revolução cubana.
Ouve-se dizer também que o Ocidente “ganhou” a Guerra Fria. Nos anos 1990, os neoliberais em sua euforia chegaram a postular até o “fim da história”, enquanto os seus alter egos “realistas” contemplavam o caminho e os meios para se consolidar um mundo “unipolar”. Um de seus feitos foi impor os seus termos no nosso debate, difundindo não apenas teorias neoliberais, culturalistas etc., mas também teorias de “polaridade” e “geopolítica”, entre outras, emprestadas da ciência política norte-americana, alheias à teoria do imperialismo da tradição marxista-leninista. A presente intervenção busca apresentar alguns esclarecimentos a respeito desses conceitos.
É certo que os termos da teoria da polaridade hoje em dia já foram apropriados por forças anti-imperialistas, ocupando lugar central nas nossas reflexões. Contudo, ainda há necessidade de esclarecimento e adaptação, se é para persistirmos no uso de tais conceitos, pois em sua forma original eles passam longe de nossos propósitos. Sobretudo, a sua ênfase analítica em “grandes potências” desvia o foco daquela que Marx chamou de “sexta grande potência”, o poder popular revolucionário. Tampouco esclarecem os desafios do desenvolvimento mundial postos aos países periféricos, que necessitam hoje, mais do que nunca, que as suas relações econômicas externas sejam subordinadas ao poder da soberania popular.
O termo mais preciso para essa análise, a nosso ver, seria “policentrismo”. Postula uma multiplicidade de centros na qual países e regiões do Sul teriam condições de seguir caminhos de desenvolvimento soberano e popular, isto é, “desconectar-se” da lei do valor dominado pelo imperialismo. Mas, afinal, seja como for a preferência terminológica, o que importa mesmo é o conteúdo da análise.
Quem ganhou a Guerra Fria?
A teoria da polaridade se estendeu ao pós-Guerra Fria ao contemplar um “momento unipolar”. Porém, não é possível sustentar que houve uma clara vitória do Ocidente. O capitalismo monopolista não emergiu da Guerra Fria ileso. Já estava em crise permanente, desde meados da década de 1960, devido à sua própria lógica contraditória e sobretudo o seu conflito com o Leste e o Sul. Saiu da Guerra Fria gravemente ferido.
O que aconteceu a partir dos anos 1970 foi uma ação retrógrada visando o resgate da dominação imperialista. Financeirização, redolarização via o petróleo, novas ondas de exportação de capital, escalada militar e saltos tecnológicos relançaram o imperialismo coletivo. Decerto, essa revanche chegou a empurrar o sistema soviético para além de seus limites e ao mesmo tempo consolidou a transição neocolonial dos países do Sul. Seria mais apropriado ver nessa fase tardia do neocolonialismo um longo impasse na transição sistêmica. Pois as contradições fundamentais do capitalismo monopolista nunca se resolveram; e a financeirização, as exportações de capitais e a militarização, apesar dos saltos tecnológicos envolvidos, tornaram-se todos elementos de uma decadência secular.
O saldo líquido não foi inteiramente a favor do imperialismo. Apesar de selar a transição neocolonial na maior parte do Terceiro Mundo, com a notável exceção da China, o relançamento do imperialismo coletivo não reverteu a descolonização, isto é, não conseguiu derrubar o sistema generalizado de soberania nacional conquistado pelos povos do Terceiro Mundo com a ajuda da União Soviética. Mesmo após quase meio século de neoliberalismo, o regime não foi suprimido ou superado.
Há certamente uma degradação do regime de soberania nacional nas periferias. Decorre da agressão imperialista constante e da polarização social avançada, em especial do crescimento gigantesco das reservas de trabalho, gerando forças neofascistas no interior dos países e levando até mesmo a novas situações semicoloniais em uma série de países que sucumbiram à invasão imperialista e à fragmentação territorial. Porém, cabe enfatizar novamente, que o regime geral de soberania nacional não foi derrubado até hoje, e esta é uma vitória consagrada dos povos do Sul.
Tampouco o fim da Guerra Fria pôs fim ao movimento comunista, apesar do colapso e desmembramento da União Soviética. O movimento comunista recuou, mas também passou por transformações ao ponto de fazer um salto econômico espetacular, especialmente na China, como também importantes inovações em Cuba sob o peso do bloqueio econômico. Pergunta-se o óbvio: é possível ainda dizer hoje que o Ocidente venceu a Guerra Fria?
Seria mais preciso dizer que o impasse do neocolonialismo tardio está sendo minado pelo avanço novamente das forças antiimperialistas, que desta vez encontram um contrapeso sistêmico na própria China. Mesmo hoje não se justifica um foco analítico em “grandes potências”. Por um lado, o nacionalismo nas periferias vem se radicalizando e, por outro, a trajetória da China permanece intimamente ligada ao Terceiro Mundo. O futuro da própria China dependerá do caráter dessa relação.
Ao longo desse impasse sistêmico, a aliança transatlântica manteve a sua coesão efetiva e a sua insistência em prol do expansionismo e da agressão, dado que o propósito único da OTAN sempre foi a destruição dos obstáculos ao capitalismo monopolista. A aliança expandiu as suas operações para a África e a Ásia, devorou a Europa do Leste e continuou a ameaçar o desmembramento da Rússia. Mas internamente, a mesma lógica monopolista, uma vez financeirazada e generalizada, fez estancar os salários e erodir a política de pleno emprego, desfazendo os pactos sociais e os pilares materiais da própria experiência social-democracia. Sob tais condições, o retorno ao fascismo era questão de tempo, em ambos os lados do Atlântico. Há até quem acreditou que o neofascismo iria geral uma crise na própria OTAN, que a chegada de Trump iria colocar em cheque a sua essência liberal! Mas o liberalismo nunca foi a razão de ser da OTAN e, sim, a generalização do capitalismo monopolista.
A retomada da Guerra Fria
As contradições sistêmicas que movimentaram o longo impasse do neocolonialismo tardio estão hoje se acirrando. Se a emergência da China é a força que mais aproveitou da decadência do imperialismo coletivo e minou a infraestrutura econômica do sistema neocolonial, a violenta confrontação da OTAN com a Rússia na Ucrânia e o genocídio na Palestina, configuram no seu conjunto um ponto de inflexão.
A Rússia, como o principal país herdeiro da União Soviética – integrando grande parte do seu território, do seu povo e da sua memória, e beneficiando-se da sua capacidade tecnológica, recursos energéticos e energia nuclear – continuou a apresentar obstáculos ao expansionismo da OTAN. O foco da disputa voltou para a Ucrânia, que sempre teve um valor estratégico superior nos desenhos da OTAN, como do exército nazista antes. A transformação da Ucrânia na ponta de lança do imperialismo era questão de tempo.
A instrumentalização da Ucrânia pela OTAN foi tudo menos um exercício de soberania. A soberania nacional é, acima de tudo, uma fórmula antiimperialista para o exercício do poder popular. A instrumentalização da Ucrânia através de um golpe, promoção de forças neonazistas no aparelho de Estado, a sua tutela pelo aparato militar da OTAN e lançamento de uma guerra contra minorias étnicas russas no leste do país, em Donbass, foi um ato de liquidação de soberania. A Ucrânia mergulhou numa situação semicolonial simulada, sem que fosse diretamente ocupada e dividida, mas mesmo assim reprogramada para lançar uma guerra contra si mesma e para apontar as armas para a Rússia. Nessa situação, qualquer tentativa de incorporar o país na OTAN, com tropas e misseis na fronteira, foi obviamente um casus belli para a Rússia. A Rússia tinha o direito de intervir.
A intervenção foi realizada contra um consolidado eixo OTAN-Neonazista. Ao longo dos últimos dois anos, uma guerra horrível tem sido travada às custas do povo ucraniano e da juventude de ambos os lados, recrutada na campanha da guerra. Longe de seus supostos ideários liberais, a OTAN mostrou mais uma vez que não tem constrangimento nenhum em apoiar forças nazistas fora das suas fronteiras, custe o que custar, e patrocinar guerras no ultramar, aumentando sistematicamente as apostas com cada vez maiores aportes orçamentários e transferências de armas pesadas para a Ucrânia. A OTAN também duplicou o tamanho da sua fronteira terrestre com a Rússia pela entrada da Finlândia na aliança em abril deste ano. Uma extensa frente contra a Rússia tomou forma mais uma vez, com ideologia supremacista. A capacidade da OTAN para a provocação e a escalada do conflito está sempre dada, mesmo que atualmente haja um evidente desgaste com a guerra.
Cabe acrescentar que essa guerra é também um trágico alerta sobre o que acontece quando um país mais vulnerável não consegue sustentar uma política de Não Alinhamento Positivo diante Estados mais capazes de defender os seus interesses estratégicos. Afinal, essa foi a lição histórica mais importante do Movimento de Bandung: a razão do não-alinhamento justamente a preservação de Estados menores contra a sua incineração numa briga entre os grandes.
Se essa guerra na Ucrânia é uma extensão da dimensão Leste-Oeste da Guerra Fria, a guerra na Palestina, que estourou novamente em outubro deste ano, é a essência do mesmo conflito Norte-Sul de sempre. Trata-se de uma clássica situação de assentamento colonial patrocinada pelo imperialismo, uma das últimas situações coloniais não resolvidas do século passado e a mais consequente para a transição sistêmica no século XXI. O Estado sionista nunca deixou de cumprir as suas funções essenciais, objetivando a dominação dos povos da região, a degradação das suas soberanias e o controle sobre os seus recursos energéticos e as rotas comerciais.
O genocídio em curso contra o povo palestino é a prova cabal da barbárie do imperialismo coletivo liderado pelos Estados Unidos e da natureza fascista de seus desenhos estratégicos. Assistimos à uma limpeza étnica declarada contra um povo sob ocupação, perpetrada pelo Estado sionista e apoiada pelos Estados Unidos e pela União Europeia. Dezesseis mil palestinos já morreram em dois meses, desde 7 de outubro, dos quais 40 por cento foram crianças, e mais quarenta mil ficaram feridos nos bombardeios. Se havia alguma dúvida ainda sobre o caráter civilizacional do Ocidente, já virou pó nos bombardeios de Gaza.
Essa tragédia, por sua vez, é também uma demonstração de como evoluirá a partir de agora a chamada “transição multipolar”: enquanto as potências semiperiféricas buscam jogar em todos os tabuleiros, em um novo fenômeno de “multialinhamento”, o povo trabalhador do Terceiro Mundo, preso e asfixiado em reservas de trabalho irá se rebelar e forçar o avanço da transição sistêmica.
Cabe acrescentar que a única possibilidade de fissuras por dentro da OTAN é através da implosão de um ou mais governos sob pressão popular. Não podemos descartar essa possibilidade em nosso tempo, embora o proletariado no Ocidente ainda falte organização e consciência histórica. Mas a dinâmica neoliberal-neofascista dirigida pelos monopólios dentro das suas arenas nacionais tomou conta da região toda e colocou-a num caminho de declínio e polarização social que também alimenta revoltas internamente.
Ademais, a marginalização das comunidades imigrantes de origem africana e asiática acrescenta um fator crucial no impulso das revoltas. As recentes manifestações maciças contra o genocídio palestino em muitos casos impulsionaram para à frente da cena política as próprias comunidades racialmente oprimidas. Essas fissuras irão se aprofundar. A exata coloração ideológica de eventuais rachaduras continua imprevisível, e sabemos que o fascismo está sempre a postos. Mas no século XXI não está mais dado o curso desta disputa.
Desafios da transição sistêmica
As fissuras no plano global estão mais maduras. A infraestrutura do domínio neocolonial está cedendo sob o peso da crise permanente do imperialismo e da emergência chinesa. Nos últimos vinte anos, a economia mundial passou para um padrão de comércio inteiramente novo cujo centro hoje é a China, sendo este país o principal parceiro comercial da grande maioria dos países do mundo. A China também é uma enorme fonte de recursos financeiros, que o próprio Ocidente absorve para se sustentar.
A função da resistência especificamente econômica por parte da Rússia é também notável nesta conjuntura. Além de bloquear o avanço militar da OTAN, também enfrentou com sucesso o regime de sanções unilaterais, resguardando a sua moeda e firmando novas parcerias comercias. Ademais, as pesadas sanções impostas sobre a Rússia e o confisco de 300 bilhões de suas reservas em dólar fortaleceram a aproximação da Rússia com a China e o Irã. Tal parceria estratégica hoje apresenta novas possibilidades de transações econômicas e comercialização do petróleo fora do dólar e de Wall Street, isto é, fora dos mecanismos operacionais do regime de sanções unilaterais. As rachaduras prometem ampliar cada vez mais o espaço de manobra para o Terceiro Mundo e, inclusive, para as revoltas populares.
Contudo, uma ressalva está em ordem: salvo um repentino colapso financeiro em Wall Street, que também não pode ser descartado dado o grau de endividamento, o caminho para um sistema monetário e financeiro alternativo permanece longo. Isso vale para a iniciativa dos BRICS, liderada pela China, que teoricamente tem o potencial de deslocar ainda mais a correção de forças. Mas o futuro dos BRICS dependerá do grau de coesão de um grupo de países cujos sistemas políticos, na sua maioria, continuam imprevisíveis ou pouco confiáveis em termos estratégicos, que mantem simultaneamente relações econômicas e/ou militares estreitas com o imperialismo, nessa fase de “multialinhamento”. As suas posturas internacionais ainda não têm a convicção necessária para sustentar um avanço robusto contra estrutura econômica de dominação neocolonial. Este é o caso da maioria dos membros, nomeadamente a Arábia Saudita, a Argentina, o Egito, os Emirados Árabes, a Índia e o próprio Brasil.
Se avaliado pela estrutura neocolonial ainda em vigor nesta fase do imperialismo, o novo mundo policêntrico – comumente denominado “multipolar” – ainda não tomou forma, por mais que esteja a caminho. Seja como for a conveniência terminológica, cabe enfatizar que o termo “policentrismo” diz respeito não apenas a distribuição de um conjunto de capacidades militares, econômicas e outras, mas a capacidade por parte de países e regiões de se desconectarem da lei do valor mundial dominada pelo imperialismo e construir um caminho de desenvolvimento autocentrado, soberano e popular.
A construção de um mundo policêntrico, nos termos aqui colocados, pressupõe a identificação mais precisa do conjunto de desafios que vigoram nesta crise permanente. Nestes termos, a transição sistêmica está ainda incipiente; e a contradição principal permanece a mesma entre o imperialismo e os povos trabalhadores do Terceiro Mundo. Contudo, a contradição principal adquire novos contornos à medida que se aprofunda a crise do capitalismo monopolista, agregando os seguintes elementos.
- A expansão maciça das reservas de trabalho na economia mundial e a sua concentração nas periferias do sistema, configurando formações sociais historicamente distintas e duradouras que apresentam desafios inéditos pela gravidade da crise da reprodução social que as convulsiona.
- A concentração e, ao mesmo tempo, a absorção cada vez mais estreita das burguesias periféricas nos sistemas globais de valor sob o comando do capitalismo monopolista-financeiro, embora com deslocamentos na orientação comercial rumo à China e, em alguns contextos condicionados pela radicalização anti-imperialista e sanções unilaterais, a emergência de frações burguesas patrióticas associadas à incentivos estatais (China, Rússia, Irã, Iêmen, Zimbábue, Venezuela, etc.).
- A emergência econômica da China no próprio terreno económico da Tríade, isto é, no comércio, nas finanças e na tecnologia, e ademais, a integração econômica do mundo à sua trajetória.
- A aceleração do aquecimento global e de fenômenos climáticos extremos e especialmente catastróficos nos trópicos justamente onde se concentram as reservas de trabalho.
- A inauguração de uma longa época marcada por pressões insurrecionais permanentes, que emanam da polarização social já avançada, onde novamente se concentram as reservas de trabalho.
- A escalada militar generalizada do Ocidente, expandindo a sua presença militar ao redor do mundo, articulando novas alianças e atingindo um novo patamar de hostilidades, chegando a armar um confronto nas fronteiras de um país membro do Conselho de Segurança da ONU e agora promovendo sem constrangimento moral nenhum um genocídio contra o povo palestino.
Se analisarmos corretamente o rumo deste conjunto de contradições devemos concluir que, se não se consolidar a transição ao policentrismo a tempo, o que está na agenda do século XXI é o genocídio em série contra os povos trabalhadores da África, da Ásia e da América Latina e do Caribe, que enfrentam uma crise existencial.
Não há transição que não seja ao socialismo
A construção de um mundo policêntrico, que certamente será um caminho longo, implica sobretudo na construção do próprio socialismo. E nessa construção, seria óbvio olhar para a China e a sua liderança. Porém, os limites da própria China precisam ser analisados, especialmente na conjuntura da intensificação da contradição sistêmica.
Por um lado, a China alavancou inovações institucionais no seu sistema de planificação central que a blindaram dos piores efeitos da lei do valor mundial, criando condições para um caminho de desenvolvimento próprio. Apesar das concessões extensivas ao capitalismo, é o país que navegou os desafios da transformação econômica com mais clareza, inovação e agilidade, sem abrir mão de ganhos substantivos da Revolução de 1949, especialmente em sua questão agrária. Também, demonstrou que o capitalismo só é possível funcionar para o benefício dos povos da periferia do sistema sob controle de um Partido Comunista. Afinal, esse sempre foi o sentido da acumulação primitiva socialista.
Contudo, uma das grandes questões postas a essa trajetória socialista única, é o futuro das suas relações econômicas com as periferias do sistema. Na medida em que uma nova rodada de acumulação socialista primitiva ocorreu, ela hoje tem uma dimensão global, diferente de tudo que vimos antes. Vale lembrar que a União Soviética não teve relações econômicas substantivas com a maior parte do Terceiro Mundo, com as notáveis exceções da Índia, da China, e do Egito por certo tempo, e de Cuba até o final. O caminho que essa nova relação econômica mundial tomará é crucial para a transição policêntrica.
O máximo que se pode esperar é que a China continue a circular excedentes via a Iniciativa Cinturão e Rota, que construa novas e modernas infraestruturas, que compartilhe tecnologias avançadas, que plante sementes para a industrialização periférica. Mas nada disso será suficiente para enfrentarmos os desafios postos hoje ao Terceiro Mundo. A China não deslocará a lei do valor ao ponto de favorecer uma industrialização periférica capitalista generalizada, tampouco irão suprimir a lei do valor fora das suas fronteiras pela produção de utilidades públicas à altura da crise de reprodução social atual.
Nas condições atuais, a transição policêntrica não dependerá da China e, sim, de nós, da nossa insurgência, das nossas capacidades de alterar a correlação de forças. A salvação não vem de fora – como também não veio de fora na Guerra Fria do século passado.
Tomar o rumo policêntrico singifica coisas muito concretas para nós: absorver as enormes reservas de trabalho concentradas no Terceiro Mundo em condições dignas de vida; estabilizar e equilibrar, econômica, social e politicamente, as relações campo-cidade via reformas agrárias radicais; planificar uma industrialização soberana, rural e urbana, sem medo de desmontar e recompor cadeias produtivas; e enfrentar às mudanças climáticas em diversos níveis de ação e especialmente por meio de novas formas de propriedade de caráter socialista para estabelecer uma nova relação entre economia e natureza.
A alteração das relações de força em escala nacional e regional ao redor das periferias permanece crucial para o conjunto da transição sistêmica. E o prazo não é menos crucial: a transição tem que ocorrer, substantivamente, até meados do século XXI, se é para se evitar o crescimento catastrófico das reservas de trabalho e as piores consequências do aquecimento global.
Existe outra medida da transição ao policentrismo senão pela transição ao socialismo? Já nos encontramos numa situação pré-revolucionária mundial, sob permanente pressão insurrecional nas periferias, que não pode mais ser ignorada. Nesse sentido, cabe lembrar uma afirmação de Marx da época em que “cinco grandes potências” disputavam o poder do continente europeu e do ultramar: o que realmente importa, afirmou Marx, é a “sexta grande potência”. Nas suas palavras, escritas em fevereiro de 1854 (tradução nossa):
[…] não devemos esquecer que existe uma sexta potência na Europa, que em certos momentos afirma a sua supremacia sobre o conjunto das chamadas cinco “grandes” potências, e as faz tremer, cada uma delas. Esse poder é a Revolução. Longa, silenciosa e cansada, é agora novamente chamada à ação pela crise comercial e pela a escassez de comida.
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A Polycentric World Will Only Be Possible by the Intervention of the ‘Sixth Great Power’
by Paris Yeros
Federal University of ABC (UFABC), Brazil – December 2023
The collective imperialism of the Triad (US-EU-Japan) evolved after the Second World War under the aegis of the United States to give strategic coherence to the expansion of monopoly capitalism against the socialist East and the emerging South. Its objective was to confront the unprecedented resistance to monopoly capitalism presented by both the Soviet system, which had had emerged victorious against Nazism, and the Third World which was on the path of decolonization. This contradiction was theessence of the systemic rivalry of the Cold War. Its origins lie precisely in the two great anti-imperialist events of the twentieth century: socialist revolution and general decolonization.
It is said that the post-war period created a ‘bipolar’ system between East and West. In fact, the conflict was much greater. It consisted of a systemic contradiction between imperialism and all anti-imperialist forces, not just deriving from the East. What is more, in this contradiction, the essence of the conflict, even between East and West, soon came to revolve around the forces of national liberation of the peoples of the Third World. That is, national liberation struggles became the principal driving force of postwar systemic rivalry. They found in the Soviet Union a systemic counterweight to imperialism, if not direct support, while the East-West conflict itself gained its dynamism in the liberation struggles on the peripheries. It is no coincidence that the biggest nuclear confrontation of the Cold War took place on account of the Cuban revolution.
It also said that the West ‘won’ the Cold War. In the 1990s, neoliberals in their euphoria even postulated the ‘end of history’, while their ‘realist’ alter egos contemplated the ways and means of consolidating a ‘unipolar’ world. One of their achievements was to impose their terms on our debate, spreading not only neoliberal and culturalist theories, but also theories of ‘polarity’ and ‘geopolitics’, among others, borrowed from North American political science, unrelated to theory of imperialism of the Marxist-Leninist tradition. This present intervention seeks to provide some clarification regarding these concepts.
It is true that the terms of polarity today have already been appropriated by anti-imperialist forces to occupy a central place in our reflections. However, there is still need for clarification and adaptation, if we are to persist in using such concepts, given that in their original form they are distant from our purposes. Above all, the analytical emphasis on ‘great powers’ diverts the focus from what Marx had called the ‘Sixth Great Power”, people’s revolutionary power. Nor do they clarify the challenges of global development that confront the peripheral countries, which today, more than ever before, require that their external economic relations be subordinated to the power of popular sovereignty.
The most accurate term for the coveted transition, in our view, would be ‘polycentrism’. It postulates a multiplicity of centers in which countries and regions of the South are able to pursue paths of sovereign and popular development, that is, ‘delink’ from the law of value dominated by imperialism. But, after all, whatever the terminological preference, what really matters is the content of the analysis.
Who won the Cold War?
The theory of polarity survived into the post-Cold War period to contemplating a ‘unipolar moment’. Yet, it is not possible to maintain that in that transition there was a clear victory for the West. Monopoly capitalism did not emerge from the Cold War unscathed. It was already in permanent crisis, since the mid-1960s, due to its own contradictory logic and above all its conflict with the East and the South. The West came out of the Cold War gravely injured.
What happened from the 1970s onwards was a retrograde attempt to rescue imperialist domination. Financialization, re-dollarization via the oil market, new waves of capital exports, military escalation, and technological leaps relaunched collective imperialism. Certainly, this revenge pushed the Soviet system beyond its limits and at the same time consolidated the neocolonial transition of the countries of the South. It would be more appropriate to see in this late phase of neocolonialism a long impasse in the systemic transition. For the fundamental contradictions of monopoly capitalism were never resolved; and financialization, capital exports, and militarization, despite the technological leaps involved, have all become elements of a secular decline.
Thus the net balance was not entirely in favor of imperialism. Despite sealing the neocolonial transition in most of the Third World, with the notable exception of China, the relaunch of collective imperialism did not reverse decolonization, that is, it failed to knock down the generalized system of national sovereignty achieved by the peoples of the Third World with the help of the Soviet Union. Even after almost half a century of neoliberalism, the regime has not been suppressed or overcome.
There is certainly a degradation of the national sovereignty regime in the peripheries. It results from constant imperialist aggression and deep social polarization, especially manifest in the gigantic growth of labor reserves, generating neofascist forces within countries and even leading to new semi-colonial situations in a series of countries that have succumbed to imperialist invasion and territorial fragmentation. However, it is worth emphasizing again that the general regime of national sovereignty has not been overthrown to this day, and this is a sacrosanct victory for the peoples of the South.
Nor did the end of the Cold War put an end to the communist movement, despite the collapse and dismemberment of the Soviet Union. The communist movement retreated, but it also underwent transformations to the point of making a spectacular economic leap, especially in China, as well as important innovations in Cuba under the weight of the economic blockade. The obvious question may put again: is it still possible to say today that the West won the Cold War?
It would be more accurate to say that the impasse of late neocolonialism is being undermined by the renewed advance of anti-imperialist forces, which this time around find a systemic counterweight in China itself. Even today an analytical focus on ‘great powers’ is not justified. On the one hand, nationalism in the peripheries has been radicalizing and, on the other, China’s trajectory remains closely linked to the Third World. The future of China itself will depend on the character of this relationship.
Throughout this systemic impasse, the transatlantic alliance maintained its effective cohesion and its insistence on expansionism and aggression, given that NATO’s sole purpose has always been the destruction of the obstacles to monopoly capitalism. The alliance expanded its operations into Africa and Asia, devoured Eastern Europe and continued to threaten the dismemberment of Russia. But internally, the same monopolistic logic, once financialized and generalized, caused wages to stagnate and eroded the policy of full employment, undoing the social pacts and the material pillars of the social democratic experiment. Under such conditions, the return to fascism was a matter of time, on both sides of the Atlantic. There are even those who believed that neo-fascism would create a crisis in NATO itself, that the arrival of Trump would put its liberal essence in check! But liberalism was never NATO’s raison d’être, but rather the generalization of monopoly capitalism.
The resumption of the Cold War
The systemic contradictions that led to the long impasse of late neocolonialism are now intensifying. If the emergence of China is the force that most took advantage of the decline of collective imperialism and undermined the economic infrastructure of the neocolonial system, NATO’s violent confrontation with Russia in Ukraine and the genocide in Palestine constitute a turning point.
Russia, as the main heir to the Soviet Union – integrating a large part of its territory, its people and its memory, and benefiting from its technological capacity, energy resources and nuclear energy – continued to present obstacles to NATO’s expansionism. The focus of the dispute returned to Ukraine, which has always had superior strategic value in the designs of NATO, as of the Nazi army before it. Ukraine’s transformation into the spearhead of imperialism was a matter of time.
NATO’s instrumentalization of Ukraine was anything but an exercise in sovereignty. National sovereignty is, above all, an anti-imperialist formula for the exercise of popular power. The instrumentalization of Ukraine through a coup, the promotion of neo-Nazi forces in the state apparatus, its tutelage by the NATO military apparatus and the launch of a war against Russian ethnic minorities in the east of the country, in Donbas, was an act of liquidation of sovereignty. Ukraine plunged into a simulated semi-colonial situation, without being directly occupied and divided, but nevertheless re-programmed to launch a war against itself and to point weapons at Russia. In such a situation, any attempt to incorporate the country into NATO, with troops and missiles on the border, was obviously a casus belli for Russia. Russia had the right to intervene.
The intervention was carried out against a consolidated NATO-Neonazi Axis. Over the past two years, a horrific war has been fought at the expense of the Ukrainian people and the youth on both sides recruited in the war effort. Far from its supposed liberal ideals, NATO has shown once again that it has no qualms about supporting Nazi forces outside its borders, whatever the cost, and sponsoring wars overseas, by systematically upping the stakes with ever-increasing budgetary allocations and transfers of heavy weaponry to Ukraine. NATO also doubled the size of its land border with Russia due to Finland’s entry into the alliance in April this year. An extensive front against Russia has taken shape once again, with a supremacist ideology. NATO’s capacity for provocation and escalation of conflict is always a given, even if there is currently evident exhaustion with the war.
It should be added that this war is also a tragic warning about what happens when a more vulnerable country is unable to sustain a policy of Positive Non-Alignment towards states that are more capable of defending their strategic interests. After all, this was the most important historic lesson of the Bandung Movement: the reason for non-alignment was precisely the preservation of smaller states against their own incineration in a fight between the larger powers.
If this war in Ukraine is an extension of the East-West dimension of the Cold War, the war in Palestine, which broke out again in October this year, is the essence of the same enduring North-South conflict. This is a classic situation of settler colonialism sponsored by imperialism, one of the last unresolved colonial questions of the last century and the most consequential for the systemic transition in the twenty-first. The Zionist State never stopped fulfilling its essential functions, which is to dominate the peoples of the region, degrade their sovereignty, and control energy resources and trade routes.
The ongoing genocide against the Palestinian people is clear proof of the barbarism of collective imperialism led by the United States and the fascist nature of its strategic designs. We are witnessing a declared ethnic cleansing against a people under occupation, perpetrated by the Zionist state and supported by the United States and the European Union. Sixteen thousand Palestinians have died in the two months since October 7th, of which 40 percent have been children, and another forty thousand have been injured in the bombings. If there was still any doubt about the civilizational character of the West, it has already turned to dust in the bombings of Gaza.
This tragedy is also a demonstration of how the so-called ‘multipolar transition’ will evolve from now on: while the semi-peripheral powers seek to play in all directions on the chess board, in a new phenomenon of ‘multi-alignment’, the working people of the Third World, trapped and asphyxiated in labor reserves, will rebel and force the systemic transition forward.
It should be added that the only possibility in cracks from the inside of NATO is by implosion of one or more governments under popular pressure. We cannot rule out this possibility in our time, although the proletariat in the West still lacks organization and historical consciousness. But the neoliberal-neofascist dynamic directed by the monopolies inside national arenas has long taken over the entire region and set it on a path of decline and social polarization which will also fuels revolts.
Moreover, the marginalization of immigrant communities of African and Asian origin adds a crucial factor in driving the revolts. The recent massive demonstrations against the Palestinian genocide have in many cases propelled racially oppressed communities to the forefront of the political dynamic. These fissures will deepen. The exact ideological coloring of any cracks remains unpredictable, and we know that fascism is always pouncing at every turn of events. But in the twenty-first century the course of this dispute is no longer pre-determined.
Challenges of systemic transition
The fissures at the world level are more mature. The infrastructure of neocolonial rule is buckling under the weight of the permanent crisis of imperialism and the emergence of China. In the last twenty years, the world economy has moved to an entirely new pattern of trade whose center today is China, with this country being the main trading partner of the vast majority of countries in the world. China is also a huge source of finance, which the West itself absorbs to sustain itself.
The role of economic resistance on the part of Russia is also notable at this juncture. In addition to blocking NATO’s military advance, it also successfully confronted the unilateral sanctions regime, safeguarding its currency and establishing new trade partnerships. Furthermore, the heavy sanctions imposed on Russia and the confiscation of 300 billion of its dollar reserves reinforced Russia’s convergence with China and Iran. Such a strategic partnership today present new possibilities for economic transactions and the oil trading outside the dollar and Wall Street, that is, outside the operational mechanisms of the unilateral sanctions regime. The cracks promise to increasingly expand the space for maneuver for the Third World and even for popular revolts.
However, a caveat is in order: except for sudden financial collapsein Wall Street, which also cannot be ruled out given the degree of debt, the road to an alternative monetary and financial system remains long. This applies to the BRICS initiative, led by China, which theoretically has the potential to shift further the correction of forces. But the future of the BRICS will depend on the degree of cohesion among a group of countries whose political systems, for the most part, remain unpredictable or unreliable in strategic terms, which simultaneously maintain close economic and/or military relations with imperialism, in this phase of ‘multi-alignment’. Their international posture still lack the necessary conviction to sustain a robust advance against the economic structures of neocolonial domination. This is the case for most members, namely Saudi Arabia, Argentina, Egypt, the United Arab Emirates, India and Brazil itself.
If judged by the neocolonial structure still in force in this phase of imperialism, the new polycentric world – commonly called ‘multipolar’ – has not yet taken shape, even though it is on its way. Whatever the terminological convenience, it is worth emphasizing that the term ‘polycentrism’ concerns not only the distribution of a set of military, economic and other capabilities, but the ability of countries and regions to disconnect from the world law of value dominated by imperialism and build a path of auto-centered, sovereign and popular development.
The construction of a polycentric world, in the terms stated here, presupposes a more precise assessment of the set of challenges that prevail in this permanent crisis. In the terms put here, the systemic transition remains in its infancy; and the principalcontradiction remains the same between imperialism and the working people of the Third World. However, the main contradiction has acquired new contours as the crisis of monopoly capitalism has continued to deepen, consisting of the following elements.
(a) The massive expansion of labor reserves in the world economy and their concentration in the system’s peripheries, configuring historically distinct and enduring social formations that present unprecedented challenges due to the severity of the crisis of social reproduction that convulses working people.
(b) The concentration and, at the same time, the increasingly tighter absorption of peripheral bourgeoisies in global value systems under the command of monopoly-financial capital, although with shifts in commercial orientations towards China and, in some contexts, in the process of anti-imperialist radicalizationand unilateral sanctions, the emergence of patriotic bourgeois fractions associated with state incentives (China, Russia, Iran, Yemen, Zimbabwe, Venezuela, etc.).
(c) emergence of China in the Triad’s own economic terrain, that is, in trade, finance and technology, and in addition, the economic integration of the whole world into China’s trajectory.
(d) The acceleration of global warming and extreme and especially catastrophic climate phenomena in the tropics, precisely where labor reserves are concentrated.
(e) The inauguration of a long era marked by permanent insurrectionary pressures, which emanate from the already deep social polarization, where labor reserves are once again concentrated.
(f) The widespread military escalation of the West, expanding its military presence around the world, articulating new alliances and reaching a new level of hostilities, even setting up a confrontation on the borders of a UN Security Council member and now promoting, without any moral constraint, a genocide against the Palestinian people.
If polycentrism is not consolidated in time, what is really on the agenda of the twenty-first century is serial genocide against the working peoples of Africa, Asia, Latin America and the Caribbean, that are facing existential crisis.
There is no transition other than to socialism
The construction of a polycentric world , which will certainly be a long road, implies above all the construction of socialism itself. And in this construction, it would be obvious to look at China and its leadership. However, the limits of China itself need to be analyzed, especially in the context of the intensifying systemic contradiction.
On the one hand, China leveraged institutional innovations in its central planning system that shielded it from the worst effects of the worldwide law of value, creating conditions for its own development path. Despite extensive concessions to capitalism, it is the country that navigated the challenges of economic transformation with more clarity, innovation and agility, without giving up the substantive gains of the 1949 Revolution, especially in its agrarian question. Also, it demonstrated that capitalism can only function for the benefit of the people on the peripheries under the control of a Communist Party. After all, this was always the meaning of socialist primitive accumulation.
However, one of the biggest questions facing this unique socialist trajectory is the future of its economic relations with the peripheries. As a new round of primitive socialist accumulation has occurred, it today has a global dimension, unlike anything we have seen before. It is worth recalling that the Soviet Union did not have substantive economic relations with most of the Third World, with the notable exceptions of India, China, and Egypt for a time, and Cuba until the end. The path this new world economic relationship will take is crucial for the polycentric transition.
The most that can be expected from China is that it continues to circulate surpluses via the Belt and Road Initiative, that it builds new and modern infrastructure, that it shares advanced technologies, and that it plants seeds for peripheral industrialization. But none of this will be enough to meet the challenges facing the Third World today. China will not displace the worldwide law of value to the point of favoring widespread capitalist peripheral industrialization, nor will it suppress the law of value outside its borders by producing public utilities at the height of the current crisis of social reproduction.
In the current conditions, the polycentric transition will not depend on China but on us, on our insurgency, on our abilities to change the correlation of forces. Salvation does not come from outside – just as it did not come from outside in the Cold War of the last century.
Taking the path of polycentrism means very concrete things:absorb into decent working and living conditions the enormous labour reserves concentrated in the Third World; stabilize and balance, economically, socially and politically, rural-urban relations by means of radical agrarian reforms; planning for sovereign industrialization, both rural and urban, without fear of dismantling and recomposing production systems; and confront climate change at different levels of action but especially through new forms of socialist property to establish a new relationship between economy and nature.
Changing power relations on a national and regional scale in the peripheries remains crucial to the overall systemic transition. And the deadline is no less crucial: the transition must occur, substantively, by the middle of the twenty-first century, if the catastrophic growth of labor reserves and the worst consequences of global warming are to be avoided.
Is there any other measure of the transition to polycentrism if not through the transition to socialism? We already find ourselves in a world pre-revolutionary situation, under permanent insurrectionary pressure on the peripheries, which can no longerbe ignored. It is worth remembering, in this sense, Marx’s words at a time when ‘five great powers’ competed for power on the European continent and overseas: what really matters, Marx affirmed, is the ‘sixth great power’. In his words, written in February 1854:
[…] we must not forget that there is a sixth power in Europe, which at given moments asserts its supremacy over the whole of the five so-called ‘great’ powers, and makes them tremble, every one of them. That power is the Revolution. Long silent and retired, it is now again called to action by the commercial crisis and by the scarcity of food.
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